terça-feira, 20 de dezembro de 2011

CONTRATO DE CONTRAPARTIDAS - INVALIDADE CONSEQUENTE OU DERIVADA - PROCESSO- CRIME - PROCEDIMENTO CRIMINAL - PENA - PEDIDO CÍVEL - BURLA - CRIME DE RESULTADO CORTADO OU PARCIAL - REPARAÇÃO DO PREJUÍZO - RESPONSABILIDADE CRIMINAL - ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA - RESPONSABILIDADE CIVIL POR ILÍCITO PENAL - CONTRATO ADMINISTRATIVO


Parecer PGR: CB00042010
Jurisprudência: AC STJ DE 20/03/2003 , PROC 03P241 IN WWW.DGSI.PT ; AC STJ DE 29/02/1996/02/29 , PROC 046740 ; AC DO STJ DE 22/05/2002; AC DO STJ DE 03/02/2005, PROC. 4P4745 ; AC. STJ DE 2006/07/05 , PROC. 06P1618; AC DO STA DE 28/07/2004, PROC . 1977/03 ; AC DO STJ N 7/99 DE 17/06/99, PROC. 98P993 IN DR I S DE 03/08/1999
1.ª – De acordo com o que já se concluiu no Parecer n.º 4/2010, de 4 de Maio de 2010, a nulidade da deliberação que aprovou as pré-contrapartidas fictícias acarreta a nulidade parcial do Contrato de Contrapartidas celebrado entre o Estado Português e o German Submarine Consortium (GSC) em 21 de Abril de 2004, o que deverá implicar a apresentação e prestação de novas operações de contrapartidas;

2.ª – Esta prestação de novas operações de contrapartidas não afasta a prática do crime de burla qualificada previsto e punível no artigo 218.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal;

3.ª – Também a prestação de novas operações de contrapartidas, face ao teor do pedido cível que foi deduzido no processo crime pendente, não preencherá a reparação integral dos prejuízos causados pelo ilícito penal;

4.ª – De todo o modo, para se extinguir a responsabilidade criminal, nos termos do n.º 1 do artigo 206.º aplicável ex vi n.º 4 do artigo 218.º, ambos do Código Penal, é exigida a concordância do ofendido e do arguido;

5.ª – Por outro lado, no processo crime os arguidos foram pronunciados também por um crime de falsificação de documentos previsto e punível pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea d), do Código Penal;

6.ª – Assim, a prestação de novas operações de contrapartidas, na sequência do exposto na conclusão 1.ª, não tem consequências no procedimento criminal instaurado, apenas não podendo ser ignorada na fixação da indemnização cível ali requerida;

7.ª – O acautelamento dos interesses do Estado no âmbito do processo crime pendente não impõe, pois, que a declaração de nulidade da deliberação da CPC aguarde pelo respectivo desfecho;

8.ª – Ao invés, a defesa dos interesses do Estado atinentes ao Contrato de Contrapartidas, que celebrou com o GSC e que está em execução, obriga a ponderar a actuação a desenvolver tendo em vista, em especial, a tempestiva substituição das “pré-contrapartidas fictícias”, ou seja, a apresentação e prestação de novas operações de contrapartidas


Senhor Procurador-Geral da República
Excelência:


I


Determinou Vossa Excelência o envio a este Conselho Consultivo, com carácter de muito urgente[1], do ofício, de 11 de Fevereiro de 2011, do Ministro da Defesa Nacional, cujo teor é o seguinte:


«Em Março do ano passado solicitei a Vossa Excelência que submetesse à apreciação do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (adiante CC da PGR) uma série de questões relacionadas com a interpretação e validade dos Contratos de Aquisição e de Contrapartidas dos submarinos. Quando recebi o parecer do CC da PGR (Parecer n.° 4/2010, de 4 de Maio), após uma análise cuidada do seu teor, e tendo em consideração a complexidade da matéria em questão, entendi ser necessário dirigir a esse mesmo Conselho Consultivo um pedido de esclarecimentos complementares, o que fiz em Maio desse mesmo ano. Os esclarecimentos solicitados foram-me remetidos em Setembro de 2010 (Parecer n.° 4/2010-C, de 16 de Setembro).

Face ao exposto revelou-se essencial proceder a um estudo exaustivo e global dos supra referidos pareceres, o que, tendo em conta os recursos existentes no meu Gabinete para tratar os inúmeros assuntos da minha competência, não foi possível concluir com maior brevidade.

Importa sublinhar que, à data do pedido de parecer, e posterior pedido de esclarecimentos complementares, no âmbito do processo de inquérito sob o NUIPC 125/08.4TELSB, o Ministério Público havia deduzido acusação contra três representantes da MAN FERROSTAL e sete representantes de empresas beneficiárias das Contrapartidas, pelo crime de falsificação de documentos e pelo crime de burla qualificada.

Em função disso questionou-se, no pedido de Parecer, “Se o Estado poderia, antes do trânsito em julgado do processo criminal em curso, questionar judicialmente a eventual invalidade do Contrato de Contrapartidas”. Quanto a este ponto, o CC da PGR defendeu que a nulidade da deliberação da Comissão Permanente de Contrapartidas (adiante CPC), de 20 de Abril de 2004, era passível de ser invocada antes do trânsito em julgado do processo penal. Foi igualmente questionado àquele Conselho Consultivo qual era o prazo para a arguição de uma eventual invalidade do contrato de Contrapartidas, tendo este sustentado que o pedido de declaração de nulidade do acto (deliberação da CPC) não estava sujeito a prazo.

Sucede porém que, entretanto, no âmbito do referido processo-crime, ocorreu o debate instrutório, tendo o Excelentíssimo Senhor juiz de Instrução Criminal, no passado dia 23 de Janeiro de 2011, proferido despacho de pronúncia em relação aos dez arguidos, confirmando assim a acusação deduzida pelo Ministério Público aquando da conclusão do inquérito.

Tendo em conta (i) que, nesta data, já existe despacho de pronúncia (facto superveniente), (ii) que, no âmbito deste processo-crime, o Ministério Público defende os interesse do Estado e (iii) que Vossa Excelência preside à Procuradoria-‑Geral da República, órgão superior do Ministério Público, gostaria de lhe dirigir as seguintes questões:

a) A declaração de nulidade, pela CPC, da sua deliberação de 20 de Abril de 2004 – através da qual foram aprovados os projectos de contrapartidas (fictícias) em causa no processo-crime –, defendida pelo CC da PGR nos seus pareceres como meio mais célere e adequado para salvaguardar os interesses do Estado, a ser efectuada na presente data, poderá ter alguma consequência jurídica no processo penal em curso?
b) Se, para acautelar os interesses do Estado no âmbito do referido processo penal, não determina a prudência jurídica que se aguarde pelo desfecho desse mesmo processo, tendo em consideração que a referida declaração de nulidade pode, segundo o CC da PGR, ser invocada a todo o tempo.»

Cumpre, pois, emitir parecer.
II


Na verdade, este órgão consultivo, em 4 de Maio de 2010, emitiu o Parecer n.º 4/2010[2], onde se formularam as seguintes conclusões:

«1.ª – No Contrato de Aquisição de submarinos e no Contrato de Contrapartidas atinentes, celebrados, em 21 de Abril de 2004, entre o Estado Português e o German Submarine Consortium (GSC), foi convencionada, respectivamente, na cláusula 55.ª e na cláusula 30.ª, a arbitragem, sem recurso, de acordo com o artigo 181.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), para dirimir os litígios emergentes daqueles contratos, designadamente, os relativos a interpretação, execução, incumprimento, invalidade, resolução ou redução;

2.ª – Face ao disposto nos artigos 1.º, n.os 1 e 4, da Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto [geralmente designada por Lei da Arbitragem Voluntária (LAV)], 188.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) e 180.º do CPTA, a cláusula 55.ª do Contrato de Aquisição e a cláusula 30.ª do Contrato de Contrapartidas, referidas na conclusão anterior, são válidas;

3.ª – Tais cláusulas estão, aliás, em conformidade com o disciplinado no Programa Relativo à Aquisição de Submarinos (PRAS), aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 14/98, publicada no Diário da República, I Série-B, n.º 25, de 30 de Janeiro de 1998, que após a alteração introduzida pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 100/99, publicada no Diário da República, I Série-B, n.º 204, de 1 de Setembro de 1999, estabeleceu na alínea j) do artigo 38.º que o contrato quadro devia mencionar «[o]s pressupostos do recurso à arbitragem com vista a resolver conflitos relativos a qualquer dos contratos ou ao respectivo conjunto»;

4.ª – Considerando o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 180.º do CPTA, apenas fica excluída da arbitragem a validade de actos pré-contratuais;

5.ª – Das cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas resulta o estabelecimento de cláusulas penais;

6.ª – Ora, de acordo com o n.º 2 do artigo 810.º do Código Civil, as partes podem fixar por acordo o montante da indemnização exigível;

7.ª – Os montantes fixados nas cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas correspondem ao figurino habitual nos países que exigem contrapartidas na aquisição de material de defesa;

8.ª – Consideram-se, pois, válidas as referidas cláusulas 18.ª e 19.ª do Contrato de Contrapartidas;

9.ª – No Contrato de Contrapartidas foram incluídos cinco projectos de pré-contrapartidas que careciam de causalidade, porquanto não tinham resultado da intermediação do GSC/FERROSTAL (“pré-contrapartidas fictícias”);

10.ª – Essas “pré-contrapartidas fictícias” foram aprovadas, em 20 de Abril de 2004, por deliberação da Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC);

11.ª – Esta deliberação da CPC deve ser considerada nula, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 133.º do CPA;

12.ª – Tal nulidade, por força do princípio de equiparação fixado no n.º 1 do artigo 185.º do CPA, acarreta a nulidade parcial das cláusulas 4.ª, n.º 5, 20.ª, n.º 1, e do Anexo II do Contrato de Contrapartidas;

13.ª – A nulidade apontada pode ser declarada pela própria CPC (artigo 134.º, n.º 2, do CPA);

14.ª – E o Ministério Público tem legitimidade para propor acção administrativa especial com vista à declaração de nulidade da mesma deliberação [cfr. artigo 55.º , n.º 1, alínea b), do CPTA];

15.ª – As implicações consequentes no Contrato de Contrapartidas, caso não haja acordo entre o Estado e o GSC, deverão ser dirimidas no âmbito do Tribunal Arbitral;

16.ª – Porém, a invalidade parcial do Contrato de Contrapartidas, conduzindo à expurgação das “pré-contrapartidas fictícias”, deverá implicar, atenta a especificidade das operações de contrapartidas, uma substituição, ou seja, deverão ser apresentadas novas operações – neste sentido, aponta também a cláusula 10.ª (“Modificação e substituição de operações de contrapartidas”);

17.ª – O Contrato de Contrapartidas, de acordo com o disposto na sua cláusula 22.ª, tem carácter acessório em relação ao Contrato de Aquisição e extingue-se automaticamente em caso de extinção, por forma diferente do cumprimento, do Contrato de Aquisição;

18.ª – Porém, com base em eventual incumprimento definitivo do Contrato de Contrapartidas, não haverá consequências na execução do Contrato de Aquisição;

19.ª – Assim, a problemática da recepção dos submarinos tem de ser apreciada tão-somente no âmbito do Contrato de Aquisição;

20.ª – E o incumprimento definitivo (total) do Contrato de Contrapartidas confere ao Estado o direito às indemnizações nele estipuladas, mas não lhe permite exigir a redução da sua contraprestação no Contrato de Aquisição (cfr. cláusula 19.ª do Contrato de Contrapartidas);

21.ª – O Ministério Público tem, nos termos do artigo 40.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, alínea c), do CPTA, legitimidade para propor, em nome próprio, acções relativas a contratos deduzindo pedidos relativos à validade, total ou parcial, bem como à execução quando se trate de cláusulas cujo incumprimento possa afectar um interesse público especialmente relevante;

22.ª – Contudo, face aos elementos disponíveis, não existe fundamento para que o Ministério Público desenvolva actuação nos termos da conclusão antecedente».


Posteriormente, foi proferido o Parecer n.º 4/2010-C[3], que manteve o que se disse e concluiu no parecer principal, o parecer n.º 4/2010.
III


Pretende-se, agora, em síntese, saber: se a declaração de nulidade da deliberação de 20 de Abril de 2004 da CPC (Comissão Permanente de Contrapartidas) «poderá ter alguma consequência jurídica no processo penal em curso» e «se, para acautelar os interesses do Estado no âmbito do referido processo penal, não determina a prudência jurídica que se aguarde pelo desfecho desse mesmo processo, tendo em consideração que a referida declaração de nulidade pode, segundo o CC da PGR, ser invocada a todo o tempo».

A colocação das questões parece, portanto, partir da ideia de que a declaração de nulidade pode ser invocada a todo o tempo.

Com efeito, como melhor se desenvolve no Parecer n.º 4/2010 (doravante o parecer principal)[4], a impugnação de acto nulo não está sujeita a prazo e o órgão administrativo, no caso, a CPC poderá declarar, a todo o tempo, a nulidade da deliberação.

Impõe-se, porém, desde já, recordar que a declaração de nulidade relevará na perspectiva de se considerar as consequentes implicações no Contrato de Contrapartidas.

Dito de outra forma, a abordagem do eventual impacte no “processo penal” passará, em nosso entender, pela análise e definição da situação no âmbito contratual, na sua globalidade, de acordo, aliás, com o traçado feito no parecer principal[5].

Muito brevemente, conforme melhor ali se explicitou, a nulidade da deliberação da CPC que aprovou as pré-contrapartidas fictícias acarretaria a invalidade parcial do Contrato de Contrapartidas, devendo este, consequentemente, ser objecto de redução – o que conduziria à expurgação daquelas pré-contrapartidas fictícias e, atenta a especificidade das operações de contrapartidas, a uma substituição, ou seja, à apresentação de novas operações[6].

Estas vicissitudes do Contrato de Contrapartidas, face aos elementos disponíveis, deverão, porém, ser dirimidas por tribunal arbitral, cuja intervenção será naturalmente dispensada ou evitável se houver acordo[7].

Assim, nas questões colocadas, afigura-se-nos não poder deixar-se de considerar a declaração de nulidade da deliberação em causa e bem assim as implicações no Contrato de Contrapartidas.
IV


1. Feita esta clarificação, vejamos, então, a primeira questão. Isto é, se a declaração de nulidade da deliberação da CPC que aprovou as pré-contrapartidas fictícias e as consequentes implicações no Contrato de Contrapartidas poderão ter alguma consequência jurídica no processo-crime.

Ora, importa, antes de mais, perceber de que consequências jurídicas se está a falar. Desde logo, naturalmente, parece ser de considerar o impacte no procedimento criminal. Mas poderá também considerar-se os seus efeitos nas penas e bem assim no pedido cível deduzido.

No processo crime pendente, foi, tanto quanto se sabe, proferido despacho de pronúncia pela prática de um crime de falsificação de documentos p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea d), do Código Penal e um crime de burla qualificada p. e p. pelos artigos 217.º, n.º 1, e 218.º, n.º 2, alínea a), com referência ao artigo 202.º, alínea b), todos do Código Penal.

Assim, à 1.ª questão sob consulta interessará ponderar, particularmente, a matéria atinente à infracção de burla já que no que respeita ao crime de falsificação de documentos, considerando o que já, a propósito, se disse no parecer principal, não se vislumbra sequer a possibilidade de qualquer interferência, pelo menos, de imediato.

2. Não será despiciendo, para melhor compreensão, convocar o que se escreveu, no Parecer n.º 32/2009 deste Conselho Consultivo[8] acerca do crime de burla, reproduzindo-se o seguinte excerto:

«O Código Penalx, no capítulo III, com a epígrafe “Dos crimes contra o património em geral”, do Título II (“Dos crimes contra o Património”), do Livro II (“Parte Especial”), prevê, nos artigos 217.º a 222.º, várias figuras que, atentas as respectivas epígrafes, parece reconduzir ao género comum da burla[9].

O crime de burla simples encontra-se tipificado no artigo 217.º nos seguintes termos:
«Artigo 217.º
Burla

1 — Quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, por meio de erro ou engano sobre factos que astuciosamente provocou, determinar outrem à prática de actos que lhe causem, ou causem a outra pessoa, prejuízo patrimonial é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.
2 — A tentativa é punível.
3 — O procedimento criminal depende de queixa.
4 — É correspondentemente aplicável o disposto nos artigos
206.º[x1] e 207.º[x2
E à “burla qualificada” reporta-se o artigo 218.º com o seguinte teor:

«Artigo 218.º
Burla qualificada

1 — Quem praticar o facto previsto no n.º 1 do artigo anterior é punido, se o prejuízo patrimonial for de valor elevado, com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias.
2 — A pena é a de prisão de dois a oito anos se:

a) O prejuízo patrimonial for de valor consideravelmente elevado;
b) O agente fizer da burla modo de vida;
c) O agente se aproveitar de situação de especial vulnerabilidade da vítima, em razão de idade, deficiência ou doença;
ou
d) A pessoa prejudicada ficar em difícil situação económica.

3 — É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 206.º
4 — O n.º 1 do artigo 206.º aplica-se nos casos do n.º 1 e das alíneas a) e c) do n.º 2.»

Conforme resulta do n.º 1 do artigo 217.º, a burla recobre situações em que o agente, com a intenção de conseguir um enriquecimento ilegítimo (próprio ou alheio), induz outra pessoa em erro, fazendo com que esta, por esse motivo, pratique actos que causam a si mesma (ou a terceiro) prejuízos de carácter patrimonial. O bem jurídico aqui protegido consiste, pois, no património, globalmente consideradox4.

Assim, a burlax5 é um crime de dano, cuja consumação só ocorre com a efectiva lesão do património.

A burla é, também, um crime material ou de resultado, que apenas se consuma com a saída das coisas ou dos valores da esfera de disponibilidade do sujeito passivo ou da vítima. E está-se aqui perante um crime de relação, um “crime com participação da vítima”, uma vez que a saída das coisas ou dos valores decorre de um comportamento do sujeito passivo.

Finalmente, a burla apresenta-se como um crime de resultado cortado ou parcial, já que no plano objectivo basta o prejuízo patrimonial (ou de terceiro) e no plano subjectivo exige-se que o agente actue com a intenção de obter (para si ou para outrem) um enriquecimento ilegítimo que não carece de concretização objectiva, bastando para o efeito que se observe o empobrecimento da vítima.

[...] Revelando-se pertinente uma análise mais minuciosa sobre o tipo de ilícito, a exigência de um efectivo prejuízo patrimonial pressupõe uma definição de património enquanto bem jurídico tutelado.
Tem-se a este propósito, como se sabe, debatido três teses fundamentais – as concepções jurídica, económica e económico‑jurídica de património.

FERNANDA PALMA e RUI PEREIRAx6 rejeitam o conceito puramente jurídico, que já na vigência do antigo Código Penal seria inaceitável, «por levar a conceber a burla como «simples crime contra a liberdade de disposição», cuja consumação se daria ainda que o lucro da «vítima» superasse o prejuízo sofrido» e que «no actual Código Penal, o enquadramento da burla no âmbito dos «crimes contra o património em geral» – isto é, contra o património como um todo e não contra um particular direito, como o de propriedade – impõe, decisivamente a sua rejeição».

Para aqueles Autores «[t]ão pouco se pode aceitar um conceito estritamente económico do património, dada a sua excessiva amplitude; segundo esse conceito, o crime de burla tutelaria quaisquer interesses e expectativas económicos, mesmo que não reconhecidos pelos outros ramos do direito (nomeadamente pelo direito civil)».

Assim, defendem aqueles Autores, como, aliás, a generalidade da doutrina contemporânea, a concepção económico-jurídica de património que, conforme refere ALMEIDA COSTA, «reconduz o património ao conjunto de todas as “situações” e “posições” com valor económico, detidas por uma pessoa e protegidas pela ordem jurídica ou, pelo menos, cujo exercício não é desaprovado por essa mesma ordem jurídica»x7.

Porém, conquanto ALMEIDA COSTAx8 considere, numa primeira aproximação, que as dificuldades parecem superadas na esfera da noção económico-jurídica de património, após dar conta de que o recurso aos modos de validade característicos do universo civilístico, por exemplo, implicará que, de harmonia com o disposto no artigo 280.º do Código Civil, se tenha de excluir do conceito de património as pretensões ou posições económicas decorrentes de negócios cujo fim se revela contrário à “moral social”, defende ser aconselhável a consagração de “correctores” tendentes a compaginar a concepção económico-jurídica de património com a teleologia do direito penal.

Propõe, pois, este Autor «um conceito jurídico-penal de património construído na base de uma casuística que, arrancando da citada teoria “económico-jurídica”, tende a circunscrever as posições merecedoras de tutela à luz da particular teleologia do direito criminal».

[...] Além do conceito de património que se prende com a exigência de um efectivo prejuízo patrimonial, será, ainda, adequado determo-nos um pouco em aspectos relacionados com os outros elementos do crime de burla.

É necessário, desde logo, que haja astúcia, isto é, o agente tem de agir astuciosamente. A fórmula do n.º 1 do artigo 217.º parece deixar sem sentido a querela anterior a propósito do n.º 3 do artigo 451.º do Código Penal de 1886, pois não se fala já de artifício fraudulento. Estará, portanto, excluída e exigência de manobras fraudulentasx9. Porém, como refere ALMEIDA COSTAx10, coloca-se, a questão de saber «qual o genuíno alcance do advérbio “astuciosamente”, inscrito no n.º 1 do art.º 217.º».

Aquele Autor considera, então, que o delito depende de um domínio-do-erro jurídico-penalmente relevante e «[d]ado que a matéria se prende com o próprio funcionamento do mercado e, assim, com as regras que presidem às relações patrimoniais, a solução deve procurar-se ao nível do direito privado, encontrando a pedra de toque no princípio da boa fé (em sentido objectivo)».

Assim, «[a]o reflectir uma deslealdade tida por inadmissível no comércio jurídico, o domínio-do-erro que viole os ditames da boa fé consubstancia, desde que preenchidos os demais pressupostos do delito, o desvalor característico do ilícito da burla, integrando, nessa medida, a expressão acabada do conteúdo de previsão do art.º 217º».

Em sintonia, aliás, com este entendimento, parece estar a jurisprudência. Com efeito, por exemplo no Acórdão, de 20 de Março de 2003, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no Processo 03 P 241x11 salienta-se que «[a] linha divisória entre a fraude, constitutiva da burla, e o simples ilícito civil, uma vez que o dolo in contrahendo cível determinante da nulidade do contrato se configura em termos muito idênticos ao engano constitutivo da burla, inclusive quanto à eficácia causal para produzir e provocar o acto dispositivo, deve ser encontrada em diversos índices indicados pela Doutrina e pela Jurisprudência, tendo-se presente que o dolo in contrahendo é facilmente criminalizável desde que concorram os demais elementos estruturais do crime de burla».

E a propósito da configuração do crime de burla, distinguem-se três modalidades: a primeira, quando o agente provoca o erro de outrem com palavras ou declarações expressas; a segunda, quando o erro é ocasionado através de actos concludentes; e finalmente, a burla por omissãox12.

Segundo ALMEIDA COSTA, na burla por omissão, ao contrário do que sucede nas outras situações, «o agente não provoca, agora, o engano do sujeito passivo, limitando-se a aproveitar o estado de erro em que ele já se encontra»x13.

E, conquanto alguma doutrina portuguesa discorde da admissibilidade da burla por omissãox14, a jurisprudência parece progressivamente ter vindo a aceitar esta espécie de burla. Por exemplo, no Acórdão, de 29 de Fevereiro de 1996, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no Processo 046740, considerou-se que «[h]á situações em que o silêncio doloso sobre um erro preexistente deve ser assimilado à indução em erro para efeitos criminais; assim acontece quando a vítima desconhece a realidade, o agente se apercebe desta circunstância e causa a persistência do erro, prolongando-o, ao impedir, com a sua astuciosa conduta omissiva do dever de informar, que a vítima se liberte dele; é a burla por omissão ou aproveitamento astucioso»x15. Também no Acórdão, de 22 de Maio de 2002, o STJ considerou que a conduta enganosa que se encontra no cerne do tipo criminal da burla pode ou não ser preenchida por um comportamento omissivo, no entanto, mesmo que se admita a figura da burla por omissão, a punibilidade da conduta encontra-se sempre subordinada à norma do n.º 2 do artigo 10.º do Código Penalx16.

Por outro lado, tem-se entendido que longe de envolver, de forma inevitável, a adopção de processos rebuscados ou engenhosos, a sagacidade do agente comporta uma regra de “economia de esforço”, limitando-se o burlão ao que se mostra necessário em função das características da situação e da vítima. Assim, a idoneidade do meio enganador utilizado pelo agente aferir-se-á tomando em consideração as características do concreto burladox17.

[...] O outro elemento objectivo da burla, que como vimos se articula, aliás, com o emprego de astúcia pelo agente, é o erro ou engano da vítima.

Por erro deve entender-se a falsa ou nenhuma representação da realidade concreta a funcionar como vício influenciador do consentimento ou da aquiescência da vítima. E o engano equivale à mera mentira.

Como esclarecem FERNANDA PALMA/RUI PEREIRAx18, o erro ou engano não requer uma certeza da vítima quanto à falsa figuração da realidade, mesmo que a vítima tenha dúvidas, haverá erro ou engano se ela decidir praticar os actos que produzem o prejuízo patrimonial, bastando, portanto, uma atitude da vítima estruturalmente análoga à do dolo eventual.

E, finalmente, conforme já se disse, exige-se a prática de actos por parte da vítima que lhe causem a ela ou a outra pessoa prejuízo patrimonial.

Temos, pois, como elementos objectivos do ilícito descrito no artigo 217.º do Código Penal: a astúcia do agente; o erro ou engano da vítima; a prática de actos pela vítima; e o prejuízo patrimonial da vítima ou de terceiro.

Saliente-se, ainda, que, tratando-se de um crime material ou de resultado, a consumação da burla passa por um duplo nexo de imputação objectiva: entre a conduta enganosa do agente e a prática pelo burlado de actos tendentes a uma diminuição do património próprio ou alheio; e entre estes actos e o efectivo prejuízo patrimonialx19.

[...] No que concerne aos elementos subjectivos do tipo de ilícito, há que referir que só o dolo vale como título de imputação subjectiva do crime de burlax20.

Porém, conforme já se assinalou, exige-se também que o agente tenha a intenção de conseguir um enriquecimento ilegítimo próprio ou alheio, embora a consumação do crime não dependa da efectivação do enriquecimento, verificando-se logo que ocorra o prejuízo patrimonial da vítima.»

3. Serve este excurso, antes de mais, para se constatar que a não reparação do prejuízo não integra o tipo ilícito do crime de burla qualificada p. e p. no artigo 218.º do Código Penal.

Ao invés, aliás, do que se verificava na versão originária do Código Penal, em que, de acordo com o disposto na alínea c) do artigo 314.º9, a não reparação do prejuízo até ser instaurado procedimento criminal funcionava como qualificativa da burla.

Assim, no caso, a substituição das pré-contrapartidas fictícias por acordo entre o Estado e o adjudicatário – GSC – ou por decisão do Tribunal Arbitral, ainda que tal pudesse ser visto como reparação do prejuízo – o que não parece possível face ao pedido cível deduzido no processo crime pelo ilícito penal – não afastaria a prática do crime de burla qualificada.

Por outro lado, impõe-se frisar de novo que a problemática atinente ao Contrato de Contrapartidas se coloca, conforme o desenvolvido no parecer principal, no plano da invalidade – nulidade parcial.

Assim, o eventual propósito de enganar, requisito do crime de burla, não poderá na situação em apreço deixar de se considerar que precedeu a celebração do contrato.

Estar-se-á perante uma situação, que, de algum modo, se poderá equiparar àquela a que se refere o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça acima referenciado[10], em que se entendeu que o dolo in contrahendo determinante da nulidade do contrato se configura em termos muito idênticos ao engano constitutivo da burla.

Mas voltando ao que ora importa, a substituição das pré-‑contrapartidas fictícias – por acordo ou por decisão do Tribunal Arbitral – não afasta a eventual situação criminosa[11].

Em suma, a declaração de nulidade da deliberação que aprovou as pré-contrapartidas fictícias e a consequente nulidade parcial de Contrato de Contrapartidas, bem como a substituição daquelas pré-contrapartidas, conforme delineado no parecer principal, não afectam os crimes a que se reporta o despacho de pronúncia do processo crime pendente, pelo que não têm qualquer impacte no procedimento criminal.

4. Como vimos, a reparação do dano – a existir – deixa intocado o tipo legal do crime de burla qualificada. Pode, porém, de acordo com as disposições conjugadas do n.º 4 do artigo 218.º e do n.º 1 do artigo 206.º[12] do Código Penal, conduzir à extinção da responsabilidade criminal, caso se verifiquem os restantes pressupostos ou condições – além da reparação integral dos prejuízos –, a concordância do ofendido e do arguido e não haver dano ilegítimo de terceiro.

Aquele n.º 1 do artigo 206.º do Código Penal foi introduzido na Reforma Penal de 2007[13]. Trata-se de uma novidade, que foi, aliás, objecto de alguma controvérsia, por traduzir um passo no processo de privatização da lei penal[14].

Não trazendo para aqui o debate acerca da reparação do dano como terceira espécie de sanção criminal[15] – verdadeira sanção penal reparatória –, que não interessará na economia das questões colocadas, não pode deixar de notar-se que a solução consignada naquele n.º 1 do artigo 206.º se inserirá nas concepções político-‑criminais mais recentes.

Todavia, deverá sublinhar-se que, como já acima se referiu, considerando o pedido cível que foi deduzido no processo crime, não poderá a substituição das pré-contrapartidas fictícias integrar a reparação total do prejuízo.

De todo o modo, mesmo que se se verificasse a reparação integral dos prejuízos, a extinção da responsabilidade criminal só seria possível com a concordância de ofendido e arguido.

5. Já no caso de ter lugar a reparação integral até ao início da audiência do julgamento em 1.ª instância, a pena é especialmente atenuada, face ao disposto no n.º 2 do citado artigo 206.º[16], ex vi n.º 3 do artigo 218.º, ambos do Código Penal.

Se a reparação for parcial, a pena pode ser especialmente atenuada – cfr. n.º 3 do artigo 206.º[17], também por força daquele n.º 3 do artigo 218.º. Nesta hipótese, a atenuação especial da pena não é, portanto obrigatória, como no caso da reparação integral, mas caberá na discricionariedade vinculada do juiz[18] [19].

6. Temos vindo a referir a reparação dos prejuízos.

Ora, no processo crime pendente, foi pelo Ministério Público deduzido pedido cível. Tal pedido fundou-se na prática de ilícito penal, nos termos do artigo 71.º do Código de Processo Penal. Trata-se, pois, de responsabilidade extracontratual – responsabilidade civil por factos ilícitos.

Conforme se deu conta no parecer principal, o Ministério Público formulou o pedido no montante de € 33.989.796,91, relativo ao VAN (valor acrescentado nacional) que deveria ter sido gerado por projectos desenvolvidos por empresas nacionais, com a intermediação causal do GSC/MAN FERROSTAAL.

A substituição das pré-contrapartidas fictícias, nos termos desenhados, coloca-se, é certo, no plano da relação contratual, aliás, de natureza administrativa, estabelecida entre o Estado e o GSC. Mas, naturalmente, verificando-se aquela “substituição”, tal não poderá ser ignorado no cômputo da indemnização a fixar no processo crime.
V


1. Ensaiemos agora a abordagem da 2.ª questão colocada a Vossa Excelência, que, recorde-se, é a seguinte:

«b) Se, para acautelar os interesses do Estado no âmbito do referido processo penal, não determina a prudência jurídica que se aguarde pelo desfecho desse mesmo processo, tendo em consideração que a referida declaração de nulidade pode, segundo o CC da PGR, ser invocada a todo o tempo.»

Do que se vem de dizer, não se vislumbra que interesses do Estado no âmbito do processo crime seriam postos em causa com a apresentação e execução de operações de contrapartidas em substituição das pré-contrapartidas fictícias.

E, insiste-se, refere-se a substituição das pré-contrapartidas, porque, conforme acima se sublinhou[20], no plano da relação contratual estabelecida entre o Estado e o GSC importa extrair as consequências da aprovação de pré-contrapartidas fictícias.

2. Para melhor compreensão, e também por comodidade, afigura-se pertinente reproduzir um fragmento do Parecer n. º 4/2010. Assim:

«[...] para a apreciação da validade do Contrato de Contrapartidas temos, antes de mais, de ver se se trata de invalidade do próprio contrato (invalidade originária) ou de invalidade de actos procedimentais prévios à celebração do contrato que possa acarretar a invalidade do contrato (invalidade derivada ou consequente).

O n.º 2 do artigo 185.º do CPAx21 remetia para a aplicação das disposições do Código Civil quando se discuta a falta e vícios da vontade no contrato administrativo.

Porém, nos contratos precedidos de procedimento concursal, o erro na formação ou na declaração da vontade estará praticamente afastado. Com efeito, quando há um procedimento pré-contratual, a margem de autonomia na celebração do contrato é diminuta.

E a lei portuguesa acolhe claramente a invalidade derivada: de acordo com o n.º 1 do artigo 185.º do CPAx22, os contratos são nulos ou anuláveis quando forem nulos ou anuláveis os actos administrativos de que haja dependido a sua celebração.

Como salienta PEDRO GONÇALVESx23, «[u]m dos problemas mais difíceis nesta matéria diz respeito à identificação dos actos prévios cuja invalidação origina uma invalidade do contrato». Assim, aquele Autor refere que, «[e]m primeiro lugar, deve existir uma certa relação ou conexão entre o acto prévio e o contrato, em termos de o primeiro poder considerar-se causa e o segundo efeito» e, «[e]m segundo lugar, o acto ordenado no contrato há-de ser invalidado por causa de um vício de natureza material que impeça a Administração de praticar um novo acto com o mesmo conteúdo (sem repetir o vício)».

A solução está, segundo MARCELO REBELO DE SOUSA/ANDRÉ SALGADO DE MATOSx24, em que «[p]ara averiguar se a celebração do contrato dependeu do acto pré-‑contratual viciado devem utilizar-se os mesmos critérios aplicáveis para aferir a nulidade consequente dos actos administrativos, nos termos do art. 133.º, 2, i) CPA», «ou seja, tem que haver um nexo de imputação objectiva do próprio contrato ao acto pré-contratual ilegal, em termos tais que seja razoavelmente de supor que o contrato não teria sido celebrado, ou não teria sido celebrado com o mesmo co-‑contratante e/ou com os mesmos objecto e conteúdo, se o acto pré-contratual não tivesse incorrido na ilegalidade em que incorreu».

Não obstante este entendimento ser preconizado a propósito do artigo 283.º do CCPx25, não deixa de se revestir de utilidade na presente apreciação.

[...] Atentemos então no acto de adjudicação – a Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2003.

Conforme se assinalou acimax26, as contrapartidas oferecidas constituíam um factor (Factor 4) de avaliação das propostas apresentadas, sendo que quanto às pré-contrapartidas a proposta do GSC foi considerada fraca e, como resulta das Considerações finais e ordenação das propostas, o factor contrapartidas não terá contribuído para a graduação em 1.º lugar do GSC, pois, aliás, como se podia ler nas considerações finais do factor 4, «[q]uanto ao factor contrapartidas, embora se verifique uma aproximação das propostas no que respeita ao montante total de contrapartidas e à perspectiva de efeito estruturante na economia portuguesa, a proposta apresentada pela DCN-I é, no seu conjunto, superior à apresentada pelo GSC».

Neste aspecto, aceitando que relativamente ao projecto 2.1.14. se confirma a matéria constante da acusação deduzida pelo Ministério Público, há que ver a sua influência na adjudicação e consequentemente no Contrato de Contrapartidas, ou melhor, nos contratos.

Ora, o desvalor causado na adjudicação não parece afectar em termos essenciais o seu objecto, de molde a poder considerá-la nula, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 133.º do CPA.

Com efeito, por um lado, tal matéria não se prende com o objecto imediato ou mediato da aquisição de bens (em especial com os submarinos) – o objecto do acto de adjudicação são os submarinos na versão técnica com AIP – e, por outro lado, é preciso atender à natureza das contrapartidas e, em especial, ao peso que aquela pré-contrapartida teve na decisão de adjudicação.

E não havendo no caso lei que comine expressamente essa forma de invalidade teríamos de considerar que a invalidade do acto de adjudicação implicaria a sua anulabilidade.

Será talvez oportuno recordar o que, sobre a cláusula geral de nulidade contida no segmento “actos a que falte qualquer elemento essencial” do n.º 1 do artigo 133.º do CPA, escreveram MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO GONÇALVES/J. PACHECO DE AMORIM. Assim, podem considerar-se «nulos os actos administrativos que careçam de elementos que, no caso concreto, devam considerar‑se essenciais, em função do tipo de acto em causa ou da gravidade do vício que o afecta»x27.

Segundo aqueles Autores, «“Elementos essenciais”, no sentido do n.º 1 do art. 133 do código – cuja falta determina a nulidade do acto administrativo – seriam, pois, todos aqueles que se ligam a momentos ou aspectos legalmente decisivos e graves dos actos administrativos, além daqueles a que se refere já o seu n.º 2. E, como dispomos do elenco exemplificativo ou concretizador dessa norma, nem será muito difícil apurar, por paralelismo (entre a qualidade e a quantidade de interesses públicos ou privados envolvidos em cada hipótese), outros casos de nulidade derivada da falta de elementos essenciais da sua prática»x28.

Cabe, ainda, recordar que, já antes do legislador consagrar expressamente na alínea c) do n.º 2 do artigo 133.º que são nulos os actos cujo objecto constitua um crime, uma corrente doutrinal configurava esses actos como integrando uma situação de nulidade por naturezax29.

No dizer de FREITAS DO AMARAL, «[a]s nulidades por natureza consubstanciam casos em que, por razões de lógica jurídica, o acto não pode deixar de ser nulo, por isso que seria totalmente inadequado o regime de simples anulabilidade»x30. Assim, antes do Código do Procedimento Administrativo, elencava este Autor três tipos de actos nulos por natureza:

- actos de conteúdo ou objecto impossível;
- actos cuja prática consiste num crime ou envolva a prática de
um crime;
- actos que violem o conteúdo essencial de um direito funda-
mental do cidadãox31.

Ora, como se referiu, o projecto 2.1.14, no que concerne ao acto da adjudicação, não pode ser considerado elemento essencial – no caso, o seu objecto – e consequentemente acarretar a sua nulidade.

Ao invés, quanto à deliberação da Comissão Permanente de Contrapartidas, parece ter de se considerar nula.

A deliberação que aprovou as “pré-contrapartidas fictícias” teve por objecto projectos relativamente aos quais não houve intermediação do Adjudicatário, pelo que não havendo causalidade, não podiam ser considerados contrapartidas. Poder-se-á mesmo dizer que sem a intermediação do Adjudicatário estamos perante um acto sem objecto ou de conteúdo ou objecto impossível.

E tal aprovação só terá sido possível face à ocorrência de factos integrantes dos crimes de burla qualificada e de falsificação de documentos.

Coloca-se, portanto, aqui a hipótese de enquadramento na referida alínea c) do n.º 2 do artigo 133.º do CPA, ou especialmente no seu último segmento, segundo o qual são nulos os actos cujo objecto constitua um crime.

É certo que o legislador se refere ao “objecto” do acto administrativo, mas como defendem MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA/PEDRO COSTA GONÇALVES/J. PACHECO AMORIM, há pouco citados, estão abrangidos pela parte final daquela alínea c) os actos «que, não sendo crime por esse lado, o são pela sua motivação ou finalidade, quando esta seja relevante para a respectiva prática»; assim, serão nulos «não apenas os actos cujo objecto (cujo conteúdo) constitua um crime, mas também aqueles cuja prática envolva a prática de um crime»x32 x33.

Também, segundo FRANCISCO GONZALEZ NAVARRO, «seriam nulos os actos de conteúdo delitivo, abrangendo não só os casos em que o objecto constitui um crime, como também os actos viciados por um delito, nos quais o elemento delitivo se situa no iter de produção do acto»x34.

E, como frisam GARCIA DE ENTERRIA/TOMÁS-RAMÓN FERNÁNDEZ, a infracção penal antecedente há-de ter em todo o caso uma relação directa com o acto administrativo posterior para poder implicar a nulidade absoluta deste por esse motivo, de forma que seja realmente determinante da sua emissãox35.

No presente caso, resultando que a CPC só aprovou os projectos em virtude da actuação delituosa acima referida, haverá, pois, de entender que a deliberação se encontra afectada de invalidade da maior gravidade, sendo-lhe aplicável o regime mais severo da nulidade, de acordo com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 133.º do CPA.

Vejamos então as consequências no que concerne ao Contrato de Contrapartidas.

Vimos que o n.º 1 do artigo 185.º do CPA fixa um princípio de equiparação entre o tipo de invalidade do acto prévio e o tipo de invalidade do contrato.

Ora, do que se vem de dizer, a adjudicação seria anulável. Acontece, porém, que dado o tempo decorrido se terá consolidado na ordem jurídicax36 e, assim sendo, não poderá sequer pôr-se a hipótese de acarretar a anulabilidade consequente, no caso, do Contrato de Aquisição e do Contrato de Contrapartidas.

Já relativamente à deliberação da CPC que aprovou as pré-‑contrapartidas, a sua nulidade há-de reflectir-se no Contrato de Contrapartidas.

Mas parece que aqui estará essencialmente em causa o estipulado nas cláusulas 4.ª, n.º 5, e 20.ª, n.º 1, e Anexo II. O que nos leva a considerar a hipótese da invalidade parcial do Contrato de Contrapartidas.

Com efeito, face à sua relação com o Contrato de Aquisição, afigura-se-nos que o caminho será expurgar o Contrato de Contrapartidas do que seja ilegal, mantendo-se quanto ao restante conteúdo (artigo 292.º do Código Civil, aplicável ex vi alínea b) do n.º 3 do artigo 185.º do CPA)».


E no Parecer n.º 4/2010-C explicita-se, ainda:


«Ora, cabe, desde logo, precisar que no parecer principal se considera a invalidade do Contrato de Contrapartidas uma invalidade consequente ou derivada e que precisamente, face ao n.º 1 do artigo 185.º do CPA, a nulidade da deliberação da CPC reflecte-se no Contrato de Contrapartidas.

É certo que, à primeira vista, de acordo com o princípio de equiparação, fixado naquele n.º 1 do artigo 185.º do CPA, entre o tipo de invalidade do acto prévio e o tipo de invalidade do contrato, a nulidade da deliberação acarretaria sem mais a nulidade do Contrato de Contrapartidas.

Porém, afigura-se-nos que há que considerar a inserção da deliberação no procedimento pré-contratual.

A nulidade da deliberação da CPC não tem impacte em todo o procedimento antecedente e, em especial, na adjudicação, que se consolidou na ordem jurídica, como se procurou demonstrar no parecer principal.

O que está em causa naquela deliberação da CPC é tão-‑somente a aprovação das pré-contrapartidas fictícias, aprovação que influenciou o conteúdo das cláusulas 4.ª n.º 5, e 20.ª, n.º 1, e do Anexo II do Contrato de Contrapartidas.

Assim, não significando a nulidade daquela deliberação que não possam ou não devam manter-se todos os outros actos do procedimento, no caso impunha-se a celebração do Contrato de Aquisição e inerentemente do Contrato de Contrapartidas, como aconteceu, havendo apenas que expurgar este da parte afectada».

3. Ora, estando-se, é certo, face à aprovação das pré-contrapartidas fictícias, perante a invalidade derivada (parcial) do Contrato de Contrapartidas, impõe-se ter presente que este contrato está em execução.

Por outro lado, há, naturalmente, que considerar que estão estipulados prazos para a prestação das contrapartidas e em particular o prazo geral de oito anos (cfr. cláusula 8.ª).

Não se vê, pois, com que fundamento o Estado postergaria as implicações no Contrato de Contrapartidas e para que momento.

Tratando-se de uma nulidade parcial, não parece poder deixar de ser suscitada durante a execução do contrato.

A questão a colocar será, portanto, não se a prudência jurídica determina que se aguarde pelo desfecho do processo crime, mas sim se aguardar pelo desfecho do processo crime inviabilizará, em resumo, a substituição das pré-contrapartidas fictícias por verdadeiras operações de contrapartidas.
VI


Aqui chegados, é incontornável e inadiável, pois, a nosso ver, definir uma estratégia, com vista à defesa dos interesses do Estado, não esquecendo o Contrato de Contrapartidas.

Este Conselho Consultivo foi confrontado, no parecer principal, entre muitas outras questões, com a questão da validade do Contrato de Contrapartidas[21], tendo-se procedido à análise já referenciada[22].

Na sequência, entendeu-se que a deliberação da CPC que aprovou as pré-contrapartidas fictícias é nula, o que acarreta a nulidade parcial – invalidade consequente ou derivada – do Contrato de Contrapartidas, implicando, ou devendo implicar, uma substituição, ou seja, apresentação de novas operações. Foram também traçados os procedimentos atinentes.

Tivemos, agora, o ensejo de mostrar que tal não tem “consequências jurídicas” no processo crime pendente, havendo tão‑ ‑somente que, sendo caso disso, ser considerado no cômputo da indemnização a fixar naquele processo.

Porém, ao invés, se se aguardar pelo desfecho do processo crime, o Estado poderá já não conseguir dirimir as questões relativas ao Contrato de Contrapartidas.

Acrescente-se, finalmente, que se, porventura, não houver condenação pela prática do crime de burla, no processo crime não se poderá conhecer do pedido de indemnização no que se reporta à relação contratual entre o Estado e o GSC.

Com efeito, como se consignou no Acórdão n.º 7/99, de 17 de Junho de 1999, do Supremo Tribunal de Justiça[23] (Pleno), «se em processo penal for deduzido pedido cível, tendo o mesmo por fundamento um facto ilícito criminal, verificando-se o caso previsto no artigo 377.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, ou seja, a absolvição do arguido este só poderá ser condenado em indemnização cível se o pedido se fundar em responsabilidade extracontratual ou aquiliana, com exclusão da responsabilidade civil contratual».

Recorde-se, ainda, que o caso em apreço se enquadra numa relação contratual de natureza administrativa e que foi estipulada uma cláusula compromissória[24].
VII


Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª – De acordo com o que já se concluiu no Parecer n.º 4/2010, de 4 de Maio de 2010, a nulidade da deliberação que aprovou as pré-contrapartidas fictícias acarreta a nulidade parcial do Contrato de Contrapartidas celebrado entre o Estado Português e o German Submarine Consortium (GSC) em 21 de Abril de 2004, o que deverá implicar a apresentação e prestação de novas operações de contrapartidas;

2.ª – Esta prestação de novas operações de contrapartidas não afasta a prática do crime de burla qualificada previsto e punível no artigo 218.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal;

3.ª – Também a prestação de novas operações de contrapartidas, face ao teor do pedido cível que foi deduzido no processo crime pendente, não preencherá a reparação integral dos prejuízos causados pelo ilícito penal;

4.ª – De todo o modo, para se extinguir a responsabilidade criminal, nos termos do n.º 1 do artigo 206.º aplicável ex vi n.º 4 do artigo 218.º, ambos do Código Penal, é exigida a concordância do ofendido e do arguido;

5.ª – Por outro lado, no processo crime os arguidos foram pronunciados também por um crime de falsificação de documentos previsto e punível pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea d), do Código Penal;

6.ª – Assim, a prestação de novas operações de contrapartidas, na sequência do exposto na conclusão 1.ª, não tem consequências no procedimento criminal instaurado, apenas não podendo ser ignorada na fixação da indemnização cível ali requerida;

7.ª – O acautelamento dos interesses do Estado no âmbito do processo crime pendente não impõe, pois, que a declaração de nulidade da deliberação da CPC aguarde pelo respectivo desfecho;

8.ª – Ao invés, a defesa dos interesses do Estado atinentes ao Contrato de Contrapartidas, que celebrou com o GSC e que está em execução, obriga a ponderar a actuação a desenvolver tendo em vista, em especial, a tempestiva substituição das “pré-contrapartidas fictícias”, ou seja, a apresentação e prestação de novas operações de contrapartidas.


ESTE PARECER FOI VOTADO NA SESSÃO DO CONSELHO CONSULTIVO DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA, DE 14 DE ABRIL DE 2011.

Fernando José Matos Pinto Monteiro – Maria Manuela Flores Ferreira (Relatora) – José David Pimentel Marcos – Paulo Joaquim da Mota Osório Dá Mesquita – Maria de Fátima da Graça Carvalho – Manuel Pereira Augusto de Matos – Fernando Bento – António Leones Dantas – José Carlos Lopes.




[1]
Despacho de 14 de Fevereiro de 2011.
[2]
Solicitado por ofício de 10 de Março de 2010.
3 Votado na sessão de 16 de Setembro de 2010.
4 Cfr. parte V, ponto 2.
5 Cfr. especialmente parte V.
6 Cfr. também parte VI, ponto 3.4.,do parecer principal.
7 Para mais desenvolvimento, vide parecer principal.
[8]
Proferido em 25 de Fevereiro de 2010. Inédito.
x
Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, rectificado pela Declaração 5852, de 18 de Novembro de 1982, publicada no DR – IS, n.º 279, de 3 de Dezembro de 1982 (por sua vez rectificada pela Declaração 2683, de 7 de Janeiro de 1983, publicada no DR IS n.º 25 – Suplemento, de 31 de Janeiro de 1983), e alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de Maio, pelos Decretos-Leis n.os 101-A/88, de 26 de Março, 132/93, de 23 de Abril (rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 141/93, de 30 de Julho de 1993, publicada no DR IS-A, n.º 178, Suplemento, de 31 de Julho de 1993), 48/95, de 15 de Março (que o republicou e que foi rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 73-‑A/95, de 14 de Junho de 1995, publicada no DR IS-B, n.º 36, Suplemento de 14 de Junho de 1995), pelas Leis n.os 90/97, de 30 de Julho, 65/98, de 2 de Setembro, 7/2000, de 27 de Maio, 77/2001, de 13 de Julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001, de 25 de Agosto, e 108/2001, de 28 de Novembro, pelos Decretos-Leis n.os 323/2001, de 17 de Dezembro, e 38/2003, de 8 de Março, pelas Leis n.os 52/2003, de 22 de Agosto, e 100/2003, de 15 de Novembro, pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, e pelas Leis n.os 11/2004, de 27 de Março (rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 45/2004, de 24 de Maio de 2004, publicada no DR IS-A, n.º 132, de 5 de Junho de 2004), 31/2004, de 22 de Julho, 5/2006, de 23 de Fevereiro, 16/2007, de 17 de Abril, 59/2007, de 4 de Setembro (que o republicou e que foi rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 102/2007, de 25 de Outubro de 2007, publicada no DR IS, n.º 210, de 31 de Outubro de 2007) e 61/2008, de 31 de Outubro.
x1 Ver A. M. ALMEIDA COSTA, Comentário Conimbricense ao Código Penal, Parte especial, Tomo II, dirigido por JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, pág. 274.
x2
«Artigo 206.º
Restituição ou reparação
1 — Nos casos previstos nas alíneas a), b) e e) do n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do artigo
204.º e no n.º 4 do artigo 205.º, extingue-se a responsabilidade criminal, mediante a concordância do ofendido e do arguido, sem dano ilegítimo de terceiro, até à publicação da sentença da 1.ª instância, desde que tenha havido restituição da coisa furtada ou ilegitimamente apropriada ou reparação integral dos prejuízos causados.
2 — Quando a coisa furtada ou ilegitimamente apropriada for restituída, ou tiver lugar a
reparação integral do prejuízo causado, sem dano ilegítimo de terceiro, até ao início da
audiência de julgamento em 1.ª instância, a pena é especialmente atenuada.
3 — Se a restituição ou a reparação forem parciais, a pena pode ser especialmente atenuada.»
x3
«Artigo 207.º
Acusação particular
No caso do artigo 203.º e do n.º 1 do artigo 205.º, o procedimento criminal depende de
acusação particular se:
a) O agente for cônjuge, ascendente, descendente, adoptante, adoptado, parente ou afim até ao 2.º grau da vítima, ou com ela viver em condições análogas às dos cônjuges; ou
b) A coisa furtada ou ilegitimamente apropriada for de valor diminuto e destinada a utilização imediata e indispensável à satisfação de uma necessidade do agente ou de outra pessoa mencionada na alínea a).»
x4
Ver Comentário Conimbricense …, pág. 275 e que se seguirá de perto.
x5
Sobre a caracterização do crime de burla, veja-se também PAULO DÁ MESQUITA, “Sobre os Crimes de Fraude Fiscal e de Burla”, em Direito e Justiça, Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, Volume XV, 2001, Tomo 1, págs. 120-121.
x6
“O Crime de Burla no Código Penal de 1982-95”, em Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, V. 35 n.º 2 (1994), pág. 330.
x7
Ob. cit., pág. 279.
x8
Ob. cit., págs. 281-282.
x9
Em sentido contrário, FERNANDA PALMA/RUI PEREIRA, ob. cit., págs. 324 e ss.
x10
Ob. cit., págs. 297 e ss.
x11
Vide www.dgsi.pt.
x12
Contra a punição da burla omissiva pronunciam-se FERNANDA PALMA e RUI PEREIRA, ob. cit., págs. 325 e ss.
x13
Ob. cit., pág. 301.
x14
Para mais desenvolvimento, ver ob. cit., págs. 307 e ss.
x15
Cfr. www.dgsi.pt.
x16
Cfr. www.dgsi.pt.
x17
Cfr., por exemplo, o Acórdão, de 8 de Novembro de 2007, do Supremo Tribunal de Justiça (www.dgsi.pt).
x18
Ob. cit., pág. 328.
x19
Há, porém, autores que invocam um triplo nexo de causalidade (vide FERNANDA PALMA/RUI PEREIRA, ob. cit., págs. 323/324) ou mesmo um quádruplo nexo de causalidade (cfr. J. A. BARREIROS, Crimes Contra o Património, 1996, pág. 176).
x20
Interpretação conjugada dos artigos 217.º, n.º 1, e 13.º do Código Penal.
9
«Artigo 413.º
(Burla agravada)
A prisão será de 1 a 10 anos se:
a) O agente se entregar habitualmente à burla:
b) A pessoa prejudicada ficar em difícil situação económica:
c) O valor do prejuízo for consideravelmente elevado e não for reparado pelo agente, sem dano ilegítimo de terceiro, até ser instaurado o procedimento criminal.»
[10]
Acórdão, de 20 de Março de 2003, proferido no Processo 03P241. Ver também Acórdão, de 3 de Fevereiro de 2005, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no Processo 4P4745.
[11]
Aliás, isso mesmo se pode ler num trecho do despacho do pronúncia a que tivemos acesso.
[12]
«Artigo 206.º
Restituição ou reparação
1 ‑ Nos casos previstos nas alíneas a), b) e e) do n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do artigo 204.º e no n.º 4 do artigo 205.º, extingue-se a responsabilidade criminal, mediante a concordância do ofendido e do arguido, sem dano ilegítimo de terceiro, até à publicação da sentença da 1.ª instância, desde que tenha havido restituição da coisa furtada ou ilegitimamente apropriada ou reparação integral dos prejuízos causados.»
[13]
Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro.
[14]
Vide VICTOR DE SÁ PEREIRA e ALEXANDRE LAFAYETTE, Código Penal Anotado e Comentado, Quid Juris, Sociedade Editora, 2008, págs. 550 e ss.
[15]
Vide JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, reimpressão, Coimbra Editora, 2005, págs. 77 e ss., e Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte especial, Tomo II, dirigido por JORGE FIGUEIREDO DIAS, págs. 117-118.
[16]
«2 – Quando a coisa furtada ou ilegitimamente apropriada for restituída, ou tiver lugar a reparação integral do prejuízo causado, sem dano ilegítimo de terceiro, até ao início da audiência de julgamento em 1.ª instância, a pena é especialmente atenuada.»
[17]
« 3 – Se a restituição ou a reparação forem parciais, a pena pode ser especialmente atenuada.»
[18]
Ver a este propósito Comentário Conimbricense..., págs. 121 e ss.
[19]
Sobre esta questão da atenuação especial da pena no caso de prática do crime de burla qualificada, veja-se, por exemplo, o Acórdão, de 5 de Julho de 2006, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no Processo 06P1618, disponível em www.dgsi.pt.
[20]
Cfr. parte III.
x21
Como, aliás, o faz actualmente o n.º 3 do artigo 284.º do CCP.
x22
Cfr. artigo 283.º do CCP.
x23
Ob. cit., pág. 141.
x24
Ob. cit., pág. 128.
x25
«Artigo 283.º
Invalidade consequente de actos procedimentais inválidos
1 – Os contratos são nulos se a nulidade do acto procedimental em tenha assentado a sua celebração tenha sido judicialmente declarada ou possa ainda sê-lo.
2 – Os contratos são anuláveis se tiverem sido anulados ou se forem anuláveis os actos procedimentais em que tenha assentado a sua celebração.
3 – O disposto no número anterior não é aplicável quando o acto procedimental anulável em que tenha assentado a celebração do contrato se consolide na ordem jurídica, se convalide ou seja renovado, sem reincidência nas mesmas causas de invalidade.
4 – O efeito anulatório previsto no n.º 2 pode ser afastado por decisão judicial ou arbitral, quando, ponderados os interesses públicos e privados em presença e a gravidade da ofensa geradora do vício do acto procedimental em causa, a anulação do contrato se revele desproporcionada ou contrária à boa fé ou quando se demonstre inequivocamente que o vício não implicaria uma modificação subjectiva no contrato celebrado nem uma alteração do seu conteúdo essencial.»
x26
Cfr. parte III 5.
x27
Ob. cit., pág. 642.
x28
Ibidem.
x29
Para mais desenvolvimento, ver SANTOS BOTELHO/PIRES ESTEVES/CÂNDIDO PINHO, Código do Procedimento Administrativo, Anotado – Comentado – Jurisprudência, 3.ª edição, 1996, pág. 604.
x30
Direito Administrativo, volume III, Lisboa, 1989, pág. 333.
x31
Ob. cit., págs. 333/334.
x32
Ob. cit., págs. 645 e 646.
x33
No mesmo sentido MARCELO REBELO DE SOUSA, “Inexistência Jurídica”, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, Volume V, Lisboa, 1993, pág. 242.
x34
Citado por SANTOS BOTELHO/PIRES ESTEVES/CÂNDIDO DE PINHO, Ob. e loc. citados.
x35
Curso de Derecho Administrativo, I, novena edición, Civitas Ediciones, S.L., Madrid, 1999, pág. 611.
x36
Aliás, através da consulta do sítio do Instituto das Tecnologias de Informação da Justiça (www.dgsi.pt), constatamos que por acórdão, de 28 de Julho de 2004, do STA (processo n.º 1977/03) foi negado provimento ao recurso contencioso de anulação da Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2003, à qual eram imputadas diversas ilegalidades decorrentes:
– da não realização da fase da audiência prévia nos termos legalmente exigidos;
– da realização de uma nova fase de avaliação das propostas;
– da substituição do submarino pelo B....;
– da inexistência do submarino proposto pelo B....;
– da avaliação ilegal das propostas.
[21]
Cfr. parecer n.º 4/2010.
[22]
É de frisar que não cabe ao Conselho Consultivo a recolha de matéria de facto.
[23]
Acórdão de fixação de jurisprudência proferido no Processo 98P993 e publicado no Diário da República, IS-A, de 3 de Agosto de 1999.
[24]
Ver o parecer principal